"Nenhuma mulher fica feia quando sobre saltos" dizem as mães orientando as moçoilas em suas primeiras produções para festas cada vez mais precoces. "Não desce dos saltos" suplicam as amigas na tentativa de nos manterem calmas e elegantes enquanto desejamos pular no pescoço de um interlocutor qualquer. Homens possuem admiração que beira o fetiche ao salto em pernas bem torneadas. "Meu amor, tira tudo fica apenas com as botas...". E o popular insiste que a partir dos sapatos sabemos muito a respeito de alguém.
Eu, despojada e subjetiva nunca costumei usar salto - confesso isso pondo em risco metade de meus fãs - e até os trinta anos nunca havia usado salto fino. Para qualquer ocasião formal preferia o saltinho modesto de um modelo confortável acompanhando uma produção clássica. Não ficava feio e me permitia aproveitar as festas com garbo e elegância.
Historicamente o salto alto popularizou-se na corte francesa, no século dezesseis, por evidenciar a posição social do indivíduo. Através dos tempos somou-se a isso à sensualidade e outros subterfúgios que o tornaram um acessório cada vez mais cobiçado por mulheres e admirado por homens. Por não desejar me fazer notar pela estética tradicional, apesar de muito vaidosa, criei argumentos que aliados ao conforto me asseguraram motivos para usar os modelos mais discretos.
Porém nos porões da alma residem as verdades límpidas. E lá estava o receio de não conseguir me equilibrar sobre aquela fina estrutura a desafiar as leis da física e o fato de meu pé ser sucetível a bolhas e similares.
Mas como as verdades não são absolutas e o princípio da vida é de mutação, dia desses surpreendi-me ao verificar que em minha sapateira despontam alguns exemplares modestos, mas bastante significativos de saltos.
Estarei eu mudando? Afinal, quem serei eu a partir de meus calçados?
____ Trilha Incidental: Bem, é muito tarde Esta noite Para trazer o passado à tona Somos um Mas não somos os mesmos Temos que carregar um ao outro Carregar um ao outro Um... (One, U2)
____ Comunidade do Reflexões no ORKUT Eu leio Caíla
Rabiscado por Caila às 5:00 PM
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